quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Sangue de Boi


Tempos difíceis. O bom e velho Porto substituído pelo prosaico Sangue de Boi. Mesmo assim, copos e copos são vertidos todas as noites, deixando-lhe o sangue mais vermelho e quente: sangue de boi. Ou seria sangue de barata?

Fecha a porta antes de sair

 Tédio, era esta a palavra que melhor definia suas relações. Um cansativo carrossel de abraços, corpos e beijos que não lhe aquecia a alma. Exausto, de saco cheio mesmo, de usar e ser usado na busca pelo prazer, prazer que para ele se tornava cada vez mais efêmero, decidira mudar algumas coisas. Começou por apagar de seu telefone, email, msn, todos os contatos de suas ficantes. Deixou somente daquelas que, um dia, representaram algo mais que apenas um delírio de um orgasmo. Cometeu um orkuticídio. Das armadilhas virtuais, esta era a pior de todas. Acreditava que longe dos prazeres fáceis estaria mais perto de relações mais concretas, embora ele não soubesse bem o que seria uma relação concreta, mas o nome lhe soava bem aos ouvidos.

Os primeiros meses distante da noite e de seus inferninhos e boites, acabou por lhe fazer bem. Dedicou-se à leitura e à jardinagem ,algo que ele considerava coisa de viado. Descobriu novas habilidades. O sexo hebdomadário lhe fazia falta, mas o vazio que sentia após cada transa vazia não lhe provocava saudades. Vez ou outra visitava um puteiro. E quando o fazia, era com um pragmatismo mais que objetivo.

Com esta sua nova vida, sentia que se tornava uma pessoa melhor, pronto para uma relação mais concreta, como ele gostava de dizer. Achava que seria uma questão de tempo até encontrar alguém. Seus pensamentos foram quase premonitórios.

Era de tarde e o sol ainda queimava sua pele. Mudou de calçada em busca de uma sombra. Muitos tiveram esta ideia. O caminhar era retardado pelos vários encontrões. Num destes, esbarrou com uma antiga colega da faculdade. Eles se conheceram durante uma calourada. Foram apresentados por um amigo comum. Conversaram muito e só não ficaram naquele dia porque ela, bêbada, acabou se agarrando com um carinha que distribuía camisinhas na festa. Se encontraram outras vezes, mas nunca chegaram a terminar o que começaram. Naquela tarde, eles trocaram números de telefone, endereços de email, msn. Só não trocaram os endereços de seus perfis no Orkut porque ele não tinha mais nenhum. Durante três semanas, se comunicaram de todas as formas que lhes era possível. As primeiras mensagens formais deram lugar a conversas mais íntimas. Seus interesses se tocavam em muitos aspectos. O primeiro encontro foi marcado. Seria um jantar, mas ele saiu precavido: duas camisinhas e um lubrificante no bolso. Conversaram muito, riram muito. Ele a deixou em casa e, durante o caminho, ninguém propôs um motel. Ele achou isto ótimo. Sentiu prazer em estar com alguém que aparentava sentir o mesmo prazer. Os encontros se sucederam. Sempre parecidos. Sempre sem motel. A diferença era que, agora, eles já ousavam trocar beijos e carícias mais picantes no carro. Ainda faltava o sexo, mas ele já achava que finalmente uma relação concreta estava começando.

Após um mês de encontros, ela o chama para um jantar em sua casa. Ele ficou cheio de expectativas. Desta vez foram três camisinhas que pôs no bolso. O jantar mal foi mordiscado e passaram para o quarto. Transaram alucinadamente. Ele já não sentia o vazio após cada gozo. Não se sentia usado para a a obtenção de prazer de outros. Estava feliz, feliz de verdade. Levantou-se para ir ao banheiro. Não consegui disfarçar um sorriso de satisfação. Satisfação pela alegria que sentia naquele momento. Satisfação pelo seu desempenho. Conseguiu arrancar dela gritos loucos de prazer ao gozar. Achava que era só o começo. Enquanto mijava, ensaiava coisas que diria a ela. Queria falar-lhe o quanto estava feliz e o quanto havia esperado por um momento com significado. Abriu a porta do quarto e a encontrou enrolada, pronta para dormir. Achou estranho, mas começou seu discurso decorado:
- Meu bem...
Fora interrompido por ela que falou com uma voz de sono e sem se mexer na cama:
- Suas roupas estão na cadeira. Olha se não esqueces nada e fecha a porta antes de sair.