
Tempos difíceis. O bom e velho Porto substituído pelo prosaico Sangue de Boi. Mesmo assim, copos e copos são vertidos todas as noites, deixando-lhe o sangue mais vermelho e quente: sangue de boi. Ou seria sangue de barata?
Histórias exageradas que muitas das vezes não correspondem ao que aconteceu, mas que trazem consigo fragmentos importantes de amores vividos e não vividos.
“Não foi a brisa da manhã que me disse
Nem a porta displicentemente esquecida aberta
Mas sim o silêncio inquietante
Provocado nessa tua ausência
Falando que você partiu
E não mentiu!
Quando certo dia contou-me
Que seu amor é assim
Não cria raízes
Vai ficando
Até o dia
Do não querer mais... ”
Guardei este poema para o dia em que partirias. Mas tu nunca me deixaste de verdade. Tu sempre voltavas. Mesmo quando não te queria mais, tu estavas lá. E tu sabes me dobrar. E cada vez que não te queria, acabava te desejando enlouquecidamente mais e mais. Tua vida tomou outro rumo, longe da minha. Acostumei-me a ter-te a distância, ao sabor das janelas que piscam na tela. Ditadura da tecnologia que não me deixa mais que me afaste de ti. Agora que estás longe é quando mais te quero. Na paixão idealizamos o objeto de nosso desejo, então o que dizer agora que não te vejo mais? Até tua imagem pode ser do jeito que eu imaginar. E nas janelas que piscam, tu continuas a ser a mais bela, a que tem a voz mais doce, enfim...
Com o tempo, cultivei outras paixões, larguei-te um pouco. Esforço vão de te encontrar em formatos diferentes. Apaixonei-me mil vezes e mil vezes não te encontrei. Agora, não te encontro nem quando te busco. Não foste embora, mas não mais as janelas piscam e este silêncio é mais castigante do que o do poema que escolhi para o dia em que partirias. E continuas lá e em silêncio. A pior das ausências.
Guardo em mim o peso de todas as palavras que não foram ditas. De todas aquelas que não ultrapassaram a barreira dos meus dentes à espera do momento certo para ganhar o mundo. Besteira, não há o momento certo. Há a palavra certa. E eu as tinha. Hoje sofro como querendo que abortar tudo que não te disse. Todas as palavras, hoje, anacrônicas e sem sentido e que me arranham por dentro. O “eu te amo” que não disse quando sorriste pra mim pela última vez. O “te adoro, mesmo me fazendo sofrer” que troquei por um “vai se fuder” nas vezes que brigamos. O “quero ficar contigo pra sempre” que não falei por achar muito piegas. Até mesmo os “porras” e “caralhos” que não ouviste para não te magoar e ainda assim acabaste magoada. Os elogios que não fiz. Os que não ouvi. Os palavrões que não gritei quando gozava. A angústia das perguntas que não foram feitas:
Por que ainda estás comigo?
Por que perguntaste se ainda ficarias contigo?
Tu ainda ficarias comigo?
Tu ainda me amas?
Por que agora e não depois?
O que me escondeste quando disse que não estarias só, que ficaria ao teu lado com ou sem ele?